terça-feira, 5 de janeiro de 2021

Janeiro, data

 

Este mês tem uma lembrança desagradável. Inesquecível. Um dia memorável e triste. A partida de papai,  no começo de dois mil e doze. Mês de Janeiro, não neste dia. Agora, não lembro a data inteira.Mas, foi depois do dia seis de Janeiro. Lembro que na primeira semana de Janeiro eu não voltei para o trabalho e na segunda-feira, seguinte, recebi de forma tempestuosa a notícia de que se sentira muito mal e estava internado. O chão faltou e eu me senti flutuar. Contudo estava entre amigos. Tive apoio.No meio das festividades de Senhor do Bonfim da Bahia. Foi numa manhã de domingo. Foi tudo muito confuso para mim, embora ele não estivesse mais saudável, estava desenganado e eu não fosse uma garotinha. Mas, não importa o que sejamos, onde estivermos, perder um ente querido é muito doloroso. Entristeci, emudeci, chorei um pouco. Sempre em momentos de crise eu entro em comiseração íntima. Paro no tempo e no espaço. Como que para me refazer, para uma batalha...Depois religo. O tempo não para. Com o passar do tempo percebi que tinha de ter um norte. Eu não morreria junto com ele. Ninguém morre com ninguém que ama, ou desama a não ser, por acidente, um imprevisto.....Não queremos morrer e tudo que fazemos é por isto. Eu não me desesperei. A morte é algo que acontece mesmo. Encarei tudo, entendi, que o que eu não fizera antes, não valia mais. A culpa me ameaçava, com caretas. Faz isto o tempo todo. Meus irmãos(todos paternos) estavam em equilíbrio, como sempre. Eles têm seu jeito  de encarar situações. Conviviam diretamente com papai. Eu não. Convivi com ele pouco tempo. Na primeira infância. Ele se casou, mudou-se da nossa casa. Depois de seu casamento, semanalmente estava com vovó, sua mãe, em dias alternados. Conversávamos, ríamos. Ele era meu irmão mais velho, um grande amigo. Eu podia contar com ele. Ele me aceitava inteiramente, apoiava tudo que eu fazia e não suportava me ver chorar.... Depois do enterro, estava com fome e muito fraca, ofereceram-me comida almocei na casa de meu irmão(paterno, até aqui; a única vez), comida muito boa feita pela esposa dele e depois voltei para o cantinho, comigo mesma, lutando contra a dor, que se somava a outras, de outras perdas; onde eu fiquei lembrando da nossa história e como não poderia deixar de ser, estava depois de certo tampo, imersa em grande bom humor e rindo das misérias e das coisas terríveis, marca registrada de sua pessoa. Fiquei muito triste, no dia do enterro. Não foi possível vesti-lo bem, para o seu enterro. Apenas uma calça e uma camisa. Ele que amava vestir-se bem... São medidas atuais, políticas de tempo...políticas do cemitério, para os pobres. Ele era muito popular. Mas, poucas pessoas foram ao seu enterro. Muitas não souberam e a maioria de seu círculo de amigos já tinham partido. Só titio faz parte deste grupo. Estava presente com um semblante resignado. Seu irmão partira, ele sentia grande dor. Mas, se continha.Fiquei um tempo em dor e para baixo. Não publicava minha dor. Poucas pessoas sabiam. Eu tive que me consolar sozinha e uma vizinha amiga com a qual eu encontrava na rua, quando ia ao mercado me dizia, palavras de estímulo.   Tempos depois o consolo de vê-lo, em claridade, com um exuberante terno azul, azul, camisa alva por baixo do paletó e uma gravata bem colocada, combinando com tudo. Sorridente e aparentemente bem...Algo inesperado entre o sono e a vigília, coisa de Nosso Pai Eterno, que nos vê sem trégua, penso assim. Tudo foi passando. Esta visão me confortou. Quando a dor que salientar-se, empolando as memórias, esta lembrança joga água na fervura. Mas, as lembranças continuam, enquanto é possível lembrá-las.Eu sei a história de meus antepassados.A história de papai, desde seu nascimento, foi-me contada por vovó. Isto é importante, para mim. Que Deus tenha-o junto a si. Melhor lugar. O fim comum de todos. Paz de Jeová para mim, para o mundo todo.
Graça Nunes

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